15/01/2016

O NOSSO APARTAMENTO TEM NOME

Lembro-me do azul petróleo daquelas paredes. Lembro-me das telhas negras que a faziam destacar do restante casario mas do que mais me lembro é do contraste das letras pretas sobre o branco da tinta. Começaram apenas por ser coisas penduradas de forma aparentemente aleatória, como a distribuição das janelas e das portas, para mim. Eram ilegíveis e inalcançáveis. Com o tempo aprendi a ler e aquelas letras representavam a nossa casa do Alentejo, o lugar para onde íamos sempre que os meus pais tinham férias ou um fim de semana prolongado que justificasse uma viagem que se fazia em 3 horas.  
Os anos passaram e sempre que havia necessidade ou vontade de mudar o refugio as letras acompanhavam-nos. As paredes deixaram de ser azuis e passaram à cal, as telhas deixaram de ser negras e passaram a lusas clássicas mas as letras... essas repetiram-se. Essas continuaram assim pretas, com as mesmas formas, com o mesmo sentido de ninho e de refugio. 
Até que chegou o dia em que, por imposição da minha formação, arquitecta, me quiseram impor que eram pirosas, ridículas e desprovidas de sentido. Momentos houve em que pensei isso de outras letras com que me cruzei por esse país fora, mas em momentos de lucidez pensava "que moral tens tu se quando chegas ao teu refugio elas representam a tua paz? a tua harmonia? a tua família".
Aquelas paredes deixaram de acolher uma parte de mim, houve quem partisse antes do tempo (se dependesse de mim ele nunca chegaria é certo) e nós partimos daqueles terras. Mas, mas e as letras?? Para onde vão as letras? Aquelas que tanto me deram e que tanto representam para mim? Trouxe-as pois claro. São parte de mim, são parte da minha história, do meu legado. 
Hoje a escrever num qualquer apartamento com, alguma, vista para o mar olho para elas e orgulho-me de morar numa casa com nome. Um nome que é meu e que voltou ao local certo e talvez um dia alguem (que eu desejo ter como preciso do ar para respirar) escreva um dia  "A casa dos meus pais tinha nome - o nome dos meus antepassados e era uma casa feliz".

Se calhar no fundo não importa o nome que as nossas casas tenham mas sim todas as historias que elas encerram.

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