31/12/2014

HUMOR NEGRO

Era noite e as doze badaladas tocavam no adro da igreja, o meu telefone vibrou (estava no silencio) e no ecrã a mensagem dele: "Um bom ano novo para ti". Já não falávamos há algum tempo mas ele nunca se esqueceu das datas importantes, no fundo não se esqueceu de mim. 
No meu rosto as lágrimas continuavam a rolar. Incessantemente. Descontroladamente. O mundo lá fora comemorava e nós, ali numa sala fria e de coração destroçados chorávamos. 
Respondi-lhe qualquer coisa como "Um bom ano também para ti, aproveita. Eu estou no velório do meu avô". Recebo de volta um "aproveita". Aproveita?! Pensei... na verdade não pensei nada. Não havia nada para pensar naquele momento alem de chorar a partida do meu avozinho.
Uma noite em claro passou. Uma vila inteira acordou de luto. Vesti-me a rigor. Abracei corpos que desconhecia, cheirei roupa repleta de naftalina, fui afagada por muitos e reconfortada por tantos outros. Acabara de perder o único avô que conhecera, e que me ensinou com a sua humildade a não ter vergonha da nossa origem. O telefone tocou, era ele: Sara? Desculpa! os meus sentimentos. Desculpa. Ontem já estava meio bebido e quando vi a tua mensagem li (...) estou no veleiro do meu avô (...). O que fazer depois de ouvir isto?!? Sorri e disse-lhe que não havia mal, não havia o que desculpar. 
Despedi-me dele... na verdade despedi-me deles. 
Um já tinha o rosto gélido e sereno foi uma despedida para sempre.
O outro... bem o outro foi apenas um até já pois hoje é meu marido e continua a meu lado.

A passagem de ano nunca mais será a mesma... 




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